Centrais e juristas lançam campanha pela revogação da reforma trabalhista no RS

Centrais sindicais e entidades representativas de magistrados e advogados da Justiça do Trabalho lançaram na tarde fria desta quarta-feira (22) a campanha nacional pela revogação da reforma trabalhista – Revoga Já! no Rio Grande do Sul. O ato foi realizado no auditório da Associação dos Procuradores do Município de Porto Alegre (APMPA), no centro da capital gaúcha.

A campanha, deflagrada no último dia 14 de maio, durante seminário na sede da Faculdade de Direito da USP, em São Paulo, visa mobilizar todos os segmentos sociais contra os retrocessos da lei federal nº 13.647, aprovada durante o governo do ilegítimo Michel Temer (MDB), em 2017, logo após o golpe que derrubou a ex-presidenta Dilma Rosseff (PT), em 2016.

Essa legislação, longe de cumprir a promessa de gerar seis milhões de empregos, abriu uma agenda de retirada de direitos dos trabalhadores, além de ataques à organização sindical e do enfraquecimento da Justiça do Trabalho.

Passados quase cinco anos, o desemprego continua em alta: são mais de 11,9 milhões de brasileiros, segundo dados do IBGE. Além disso, a informalidade disparou desde a aprovação da reforma trabalhista, atingindo 38,7 milhões de pessoas. O número é maior do que os 35,2 milhões de trabalhadores com carteira assinada.

Manifesto pela revogação da reforma trabalhista

Durante o ato, foi lançado o “Manifesto pela revogação da reforma trabalhista”, um documento que denuncia as mazelas dessa legislação.

“A eliminação de 123 direitos garantidos pela CLT e a alteração em mais de 300 artigos e normas regulatórias, resultou no avanço do trabalho informal (sem carteira assinada), do trabalho análogo ao escravo e na precariedade nas relações de trabalho”, destaca o texto. “É preciso dar um basta a esta desgraça nacional.”

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Construir uma nova legislação para o mundo do trabalho

O presidente da CUT-RS, Amarildo Cenci, destacou a necessidade de construir uma nova legislação para o mundo do trabalho. “Temos que fazer uma atualização proativa, para que sejam incluídos nos direitos trabalhistas e previdenciários os trabalhadores que não estão contemplados e os que também não estavam contemplados antes da reforma”, defendeu.

“Vivemos no risco iminente à democracia, fruto de um golpe que abriu caminho para a implantação de uma agenda de retrocessos e retirada de direitos. A luta agora é por resistência, compondo uma vitória que traga um país mais justo”, enfatizou.

“Queremos um Brasil com direitos”, ressaltou Amarildo, salientando que os participantes firmaram “um compromisso de resistência e luta para que este país seja melhor, mais justo e mais igual”.

Houve também manifestações dos dirigentes Guiomar Vidor (CTB), Neiva Lazarotto (Intersindical), Norton Jubelli (UGT) e Alexandre Nunes (CSP-Conlutas).

Impactos da reforma nas relações de trabalho e na Justiça do Trabalho

A mesa de debates reuniu a ministra do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Delaíde Arantes, e o presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região (AMATRA IV), Tiago Mallman Sulzbach. Eles analisaram o tema “Os impactos da reforma trabalhista nas relações de trabalho e na Justiça do Trabalho”.

Delaíde apresentou dados colhidos de jornais para demonstrar a gravidade do retrocesso ocorrido após a reforma, como a triste realidade de 33 milhões de brasileiros que passam fome. Também destacou a queda da renda dos trabalhadores e recordou as quase 700 mil mortes na pandemia que poderiam ter sido evitadas se não fosse o negacionismo e a omissão do governo.

A ministra afirmou que a reforma, além de não criar empregos, afetou a dignidade dos trabalhadores. “Presenciamos o ataque a Justiça do Trabalho, o desrespeito ao Supremo, a perseguição do movimento sindical e o empobrecimento da população. Na Europa, os locais que implementaram as reformas trabalhistas como no Brasil, todos os países voltaram atrás”.

Para Delaíde, o trabalhador precisa ser bem remunerado, não só pela sua dignidade, seu sustento e de sua família, mas para a economia girar. “Somos magistrados, mas não podemos abrir mão do exercício da cidadania, precisamos discutir tudo que aconteceu e o que devemos e podemos fazer para mudar os seus efeitos”, destacou a ministra.

“Precisamos sair do mapa da fome e resgatar a dignidade do trabalhador”, afirmou, lembrando do seu início humilde na vida como doméstica. “O que aconteceu foi a desvalorização do trabalho humano, seja público ou privado, não me lembro de um momento tão delicado para as instituições”, finalizou.

Thiago disse que foi criado uma armadilha semântica onde mudaram a nomenclatura de “desempregados” para “empreendedores”, além dos milhões de brasileiros que vivem na informalidade, sem direitos, sem a garantia de rendimentos e trabalhando o dobro de horas.

“Quem ganhou com a reforma trabalhista foi apenas o mercado financeiro, com a concentração de renda. Precisamos responder qual é o modelo econômico e de mercado de trabalho que queremos, que precisamos. Provavelmente a resposta não é a retirada de direitos e rendimentos dos trabalhadores”, disse.

Para o juiz, não há relação direta entre reformas e desenvolvimento econômico. A reforma só veio beneficiar ricos e concentrar a riqueza, tirando a comida da mesa dos trabalhadores. “Assim como, se você depende de vender para o mercado interno, retirar dinheiro e rendimento nunca será bom. O salário mínimo quase não consegue comprar nem mesmo a cesta básica atualmente. A reforma só foi boa para quem vive do mercado financeiro”.

Ao concluir, Thiago destacou que rever a reforma será crucial para frear a precarização e inserir a população no desenvolvimento do país. Para ele, a segunda onda da “ofensiva” neoliberal no Brasil, desencadeada pelos governos Temer e Bolsonaro, estabeleceu como um de seus objetivos a reforma da legislação trabalhista, juntamente com a reforma da Previdência e o teto de gastos. “São peças que se articulam e têm o objetivo de aumentar os lucros nas empresas privadas e ampliar seu espaço de mercado a ser obtido com o encolhimento do setor público”, apontou.

Resistência e luta para revogar os retrocessos

O presidente da Associação Gaúcha dos Advogados Trabalhistas (AGETRA), Felipe Carmona, salientou que o movimento pela revogação reúne trabalhadores, movimento sindical, magistrados e pesquisadores. Ele resgatou a perseguição do governo após o golpe e suas ações para o enfraquecimento das entidades que defendem os trabalhadores. “Precisamos lutar para mudar este sistema que visa destruir os direitos trabalhistas”, enfatizou.

A representante da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (ABRAT), Maria Cristina Vidal Carrion, afirmou que “a revogação não vai acontecer sem conscientização, mobilização e luta. Não será com num passe de mágica”.

“Precisamos conscientizar as pessoas que, para mudar, temos que eleger representantes que tenham um histórico de luta no que desejamos. Para que haja uma alteração no direito do trabalho, no direito dos trabalhadores, é preciso que haja uma discussão na sociedade. Queremos um futuro melhor, digno e que seja com justiça social”, frisou Maria Cristina.

A representante da Associação dos Advogados e Advogadas pela Democracia, Justiça e Cidadania (ADJC), Tânia Antunes, frisou que “vivemos um momento muito difícil no país pós golpe. A reforma trabalhista trouxe inúmeros retrocessos para os trabalhadores. Tirou direitos e fragilizou a remuneração”.

Segundo Tânia, “é um problema também o trabalhador que não se vê mais como trabalhador: se vê como colaborador ou empreendedor. A reforma fragiliza o sindicato, que é o instrumento mais importante de luta organizada dos trabalhadores. Isso afeta a economia porque o trabalhador não tem mais direitos e não tem mais remuneração como antes”.

A representante da Associação dos Juristas para a Democracia (AJD), Antônia Mara Loguércio, afirmou que “é preciso revogar toda a reforma. Nada do que foi feito veio em benefício dos trabalhadores e da população. O que vimos não foi a geração de empregos, mas sim a insegurança alimentar, a volta da fome, o desemprego e o subemprego”.

“Os juízes da AJD estão solidários com esta luta, pelo princípio de proteção dos trabalhadores. Nossa luta é permanente”, destacou Antônia.

O evento contou ainda com a participação do representante do Instituto de Pesquisa e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (IPEATRA), Marcelo D´Ambroso.

 

Fonte: CUT-RS com Alan Camargo (O Coletivo) e Rodrigo Positivo (CTB). Foto: Carolina Lima / CUT-RS